07/03/2014

Pesca. Porque não?

Este será o primeiro texto que tentará dar resposta ao repto que me foi lançado pela direcção da Liga dos Amigos de Sesimbra, de escrever sobre pesca nas páginas do seu jornal. Como pexito orgulhoso que sou, vou usar uma típica expressão pexita para nomear esta minha rúbrica que tudo farei por manter com regularidade.
Escrever n'O Sesimbrense, assume para mim redobrada importância, pois foi o primeiro que publicou textos meus. Já passaram alguns anos desde que aqui escrevi pela primeira vez umas crónicas de cariz satírico, que a direcção do jornal da época teve a amabilidade de publicar.
Num momento particularmente difícil para as pescas nacionais e sesimbrenses, em virtude das difíceis condições de mar que se tem verificado desde o final do ano passado. Parece-me, também por isso, importante deixar um sinal positivo e de esperança, neste meu  primeiro texto.
Eu e muitos da minha geração cresceram a ouvir expressões dos mais velhos, sobretudo daqueles que nos eram próximos e que nos queriam bem, como "o mar é um poço!"; "Não queira ir para o mar!", "Filho meu não vai para o mar!". Sem querer desvalorizar as boas intenções dessas afirmações, nem fazer juízos de valor sobre quem as proferiu. A verdade é que hoje temos um reflexo mais ou menos visível deste tipo de tomadas de posição. A escassa entrada de jovens no sector.
Por ter crescido nesse meio, mentiria se dissesse que não compreendia essas atitudes, no contexto em que foram proferidas.
Na geração dos meus pais e das que os antecederam, isso não era uma opção. Ou melhor, ser pescador era a única opção. Não sei se poderá dizer que os jovens eram forçados a "ir para o mar", mas na grande maioria dos casos essa era a saída natural. Tenho dito e reafirmado em vários fóruns, e faço-o obviamente por essa ser uma convicção, que ser pescador não é uma profissão, é uma forma de vida. Nesses anos idos, os jovens cresciam entre os anzóis e as redes, saiam da escola e iam para as "lojas de companha" ajudar a preparar as artes. Esse processo de iniciação introduzia os jovens no sector. Aos poucos iam aprendendo da arte, iam-se enturmando com os "camaradas" do barco. Ao fim ao cabo iam tornando-se pescadores quase sem dar por isso.
A dureza da vida de pescador, somada com o repúdio inconsciente de não terem tido opção, fez com que os pais desincentivassem os seus filhos a seguirem essa vida. Isso não é forçosamente mau, nem como disse atrás deve ser criticado, era reflexo da experiência de vida e de um determinado contexto. No entanto, terá ajudado a estigmatizar a profissão. Algo que nem os que tudo faziam para afastar os filhos do mar pretendiam, pois não conheço nenhum pescador que não se orgulhe de o ser. Foi uma espécie de reflexo indesejado.
Não só pelas razões que relatei, a realidade actual é que existem poucos jovens no mar. E se existem poucos jovens com carteira profissional a exercer a actividade, lei-a-se, pescadores com cédula marítima. Existem ainda menos com habilitações superiores. Ou seja, para além da falta de pescadores, ainda se sente mais a falta de arrais, mestres, contramestres, mecânicos, etc.
E era aqui que queria chegar para falar do sinal positivo e da mensagem de esperança que queria deixar com este texto.
Na vida, tenho uma máxima de que se formos competentes naquilo que fazemos seremos bem sucedidos. É assim nas empresas, na escola, no desporto, nas artes, etc. Na pesca também é assim. A falta de activos, pode e deve ser vista por muitos jovens desempregados ou em inicio de carreira como uma oportunidade. Nomeadamente, com a possibilidade de com trabalho e dedicação existir a necessidade de sangue novo para ocupar as hierarquias superiores das embarcações. Obviamente que não existe uma linha de ascensão directa, é preciso fazer o caminho e percorrer todos os trilhos necessários até ao topo. Mas existe um espaço por ocupar, com uma aliciante particularmente determinante nas sociedades modernas. Aqueles que forem competentes e revelem capacidade para assumir os destinos duma embarcação, são remunerados em consonância com as responsabilidade e a dureza do trabalho, podendo auferir remunerações muito acima da média nacional. Felizmente não digo isto como mero exercício teórico, pois existem, infelizmente poucos, jovens nestas condições em embarcações da pesca artesanal de Sesimbra.
As condições das embarcações são hoje muito melhores, os níveis de mecanização do trabalho é muito maior, o nível de equipamento de navegação e segurança é incomparavelmente melhor.
Desengane-se quem achar que existem percursos simples, ou "el dorados", mas gostaria que cada vez mais os nossos jovens se perguntassem:
Pesca. Porque não?


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